O desrespeito do motorista ao direito de passagem do pedestre na faixa de travessia continua generalizado. De dez a 14 dias após lançar um programa contra atropelamentos, a CET verificou que 86,1% dos veículos em quatro pontos da região central ainda ignoravam a prioridade de quem estava a pé. Ou seja: deixavam de parar na faixa para dar a vez a quem tentava atravessar.
A desobediência teve pequena oscilação (dentro da margem de erro de cinco pontos) em relação ao índice de 89,6% verificado antes da campanha iniciada em maio. Para a Companhia de Engenharia de Tráfego, é natural, porque a reeducação dos motoristas não é tão rápida. Especialistas concordam, mas avaliam que a obediência só tende a ser significativa quando houver punição.
“O bolso é a parte mais sensível do corpo humano. Em Brasília funcionou muito também porque multaram adoidado”, afirma Jaime Waisman, professor da USP, em referência ao programa da capital federal nos anos 90 que inspirou a prefeitura.
Pelo código de 1998, deixar de dar preferência de passagem ao pedestre na faixa é infração gravíssima -multa de R$ 191,54. Se a pessoa estiver atravessando uma rua transversal em relação ao carro, a multa é de R$ 127,69.
Vistas grossas – Embora isso seja amplamente desrespeitado no Brasil, na prática os órgãos de trânsito, inclusive a CET, fazem vistas grossas. A companhia diz que planeja expandir as multas numa próxima fase -talvez no final do mês.
O hábito de permitir a passagem do pedestre é comum em países desenvolvidos.
Em São Paulo, a desobediência agrava os riscos de atropelamento -que deixaram 630 mortos em 2010. O levantamento da CET foi em quatro pontos do centro, primeiro alvo do plano que será levado a outros bairros.
O órgão também verificou que 42,1% de 2.677 veículos monitorados não deram a seta na conversão -outra infração que ameaça a travessia. Uma melhoria pequena diante dos 47,2% flagrados antes.
Na pesquisa, 57,3% dos condutores e 48,1% dos pedestres diziam conhecer a campanha -que, além da publicidade, começou com 108 agentes e 77 monitores para orientar a travessia.
Mas em quanto tempo pode haver algum efeito significativo? “Em Brasília levou mais de um ano”, diz Luiz Carlos Néspoli, da CET.
Sem conhecer lei, condutor acha que respeita quem está a pé – A percepção dos motoristas sobre a maneira como eles se comportam é oposta ao que se constata nas ruas: 85,2% dizem que dão preferência ao pedestre na faixa. E a própria percepção dos pedestres sobre a atitude dos condutores é mais branda do que a desobediência verificada na realidade: 68,6% relatam se sentir desrespeitados no direito de passagem.
O que ajuda a explicar as discrepâncias entre discurso e prática é a falta de conhecimento da população sobre as regras para a travessia.
“Há desconhecimento mesmo. Muitos motoristas não sabem que precisam parar para dar a prioridade ao pedestre”, avalia Luiz Carlos Néspoli, gerente de educação de trânsito da CET.
Na realidade, muita gente acha que só tem de parar no semáforo vermelho. Por lei, os veículos são obrigados a obedecer a prioridade do pedestre sempre que há faixa de travessia, inclusive ao fazer uma conversão ou em um trecho da via sem semáforo.
O desconhecimento é uma das alegações da CET para expandir as multas só na próxima fase da campanha. “Eles nem saberiam porque estariam sendo punidos.” |